ComentárioSobras do dossiêRicardo NoblatTem dossiê novo na praça? Dossiê como aquele montado na Casa Civil da presidência da República com despesas sigilosas feitas pelo casal Fernando Henrique Cardoso na época em que morava no Palácio do Alvorada?
Se tiver ainda não se materializou. Por ora, circulam informações sobre gastos, digamos assim, exóticos de ex-ministros do governo passado.
Foi o que deu conta, ontem, o jornal O Globo ao publicar reportagem de Alan Gripp e Bernardo Mello Franco. É a massagem que um ex-ministro tomou ali, a tilápia comprada por outro acolá, a freqüência com que um terceiro viajava ao Rio de Janeiro e se hospedava em hotéis de luxo.
Esse último dado embute a sugestão de que o referido ex-ministro pagava com dinheiro público seus encontros com a namoradinha carioca.
Companheiros do governo perseveram no propósito de ameaçar, constranger e intimidar quem possa lhes causar graves danos políticos ao longo da apuração de eventuais gastos irregulares com cartão corporativo. Imagine se parte dos gastos forrou o bolso de alguns deles...
Recordar é viver. Quem disse: “Ninguém colocará o governo nas cordas. Vamos abrir o suprimento de fundos desde lá atrás"? Foi o ministro Franklins Martins, da Comunicação Social.
Quem disse: “Na hora que começarmos a mexer em contas do tipo B, eu sei, ou melhor prevejo, que vamos encontrar coisas muito piores”? Foi Paulo Bernardo, ministro do Planejamento.
E quem disse: “Como a CPI do Cartão se propõe a investigar suprimentos de fundos desde 1998, vamos ser instados a prestar informações sobre exercícios passados. É possível que encontremos algo muito além da tapioca, que se tornou algo jocoso”? Foi o ministro Jorge Hage, da Controladoria Geral da União.
De fato, não teve pedra mais cantada do que essa do dossiê – e é espantosa a desfaçatez com que o governo nega que tenha alguma coisa a ver com ela.
Espantosa, não. Afinal, apenas com despesas consideradas de “interesse da segurança do Estado”, o governo federal gastou R$ 98,7 milhões entre 2004 e 2007.
Os gastos foram de R$ 16,9 milhões em 2004 e de cerca de R$ 25 milhões em 2006. No ano passado deram um salto de 42,8%, passando para R$ 35,7 milhões.
Do total de R$ 78 milhões gastos em 2007 por 11.500 portadores de cartão, R$ 58 milhões acabaram sacados na boca do caixa. Dinheiro vivo!
Em 2007, a Previdência Social gastou com cartão R$ 1,4 milhão. Que tal?
Que tal é que, além de chantagear a oposição, o governo só fez mentir desde a revelação da existência de um dossiê sobre gastos sigilosos bancados pelo governo anterior.
Mentiu ao proclamar que não havia dossiê.
Mentiu ao dizer que levantara as informações a pedido do Tribunal de Contas da União.
Mentiu ao atribuir à CPI do Cartão a encomenda do levantamento.
Mentiu ao insinuar que o dossiê possa ter sido montado por um espião do PSDB infiltrado no Palácio do Planalto. E novamente mentiu ao tentar alimentar a suspeita de que os computadores da Casa Civil possam ter sido invadidos por alguém de fora.
Lembra do mensalão – o suborno de deputados para que votassem conforme a orientação do governo?
O Procurador Geral da República concluiu que o mensalão existiu. E que serviu ao objetivo de “uma sofisticada organização criminosa” interessada em dominar o aparelho do Estado.
O Supremo Tribunal Federal aceitou a denúncia do Procurador contra 40 supostos mensaleiros.
E daí? Daí que até hoje Lula e sua turma insistem em dizer que o mensalão não passou de Caixa 2, crime praticado por todos os partidos.
Nada demais, pois, que agora prefiram chamar dossiê de “banco de dados”. E que aleguem que dossiês são instrumentos legítimos da disputa política.
A encrenca ficará de bom tamanho, mas de bom taman ho mesmo se o delegado da Polícia Federal encarregado do caso descobrir quem vazou o dossiê.
Não lhe parece razoável que ele queira saber em seguida quem fez o dossiê? E quem mandou fazê-lo?
(Oi, Erenice Guerra, braço-direito da ministra Dilma Rousseff! Oi, Dilma! Oi, Lula! Esse sempre poderá escapar jurando que não sabia e que foi traído.)